Em todo o mundo, os deprimidos são milhões. As estatísticas mais recentes indicam que 5% da população sofre de depressão, com mais prevalência nas mulheres (4,5 a 9,3%) comparativamente aos homens (2,3 a 3,2%). De qualquer modo, prevê-se que 10% das pessoas pode sofrer pelo menos um episódio depressivo ao longo da sua vida.
O início da doença pode ocorrer em todas as idades, mas a adolescência e os primeiros anos da juventude são os períodos de maior risco, sobretudo para as mulheres. Os homens, pelo contrário, estão em risco de sofrer de depressão principalmente entre os 35 e os 44 anos de idade.
Aproximadamente dois em cada dez casos de depressão prolongam-se no tempo, tornando-se crónicos. Nas mulheres, a frequência da cronicidade é quatro vezes maior do que nos homens.
A depressão é uma doença antiga: sabemos bem o que significa sofrer do "mal obscuro". Muitas personagens famosas do passado, como Edgar Allan Poe, Honoré de Balzac, Johan Wolfang von Goethe, Fjodor Dostojevskij, Leone Tolstoj, Ernest Hemingway, Michelangelo Buonarroti e, mais recentemente, Marylin Monroe, Woody Allen, Vittorio Gassman, Milv, Sandra Mondaini, Ornella Vannoni, viveram este momento terrível. E, para todos eles, descrever a sensação de inutilidade, tristeza, angústia, foi quase impossível, porque é como se, no interior da alma do deprimido, qualquer coisa se rompesse subitamente e fizesse cair a vida em pedaços, sem deixar qualquer saída. E, ao mesmo tempo, o sofrimento é tão grande que isola completamente do mundo exterior, ao ponto de parecer que os outros não conseguem compreender o tormento interior que dilacera a existência.
As descobertas sucederam-se a um ritmo vertiginoso, graças a personalidades como Henry Dale que, em 1936, recebeu o Prémio Nobel pelos seus estudos da transmissão dos impulsos nervosos ou a Ugo Cerletti, que inventou o electroencefalógrafo, um instrumento que permite estudar o comportamento do cérebro, com base na sua actividade eléctrica.
Um outro passo significativo para o tratamento da depressão, após o aparecimento, por volta dos anos 50, dos primeiros fármacos antidepressivos, deve-se a um outro Prémio Nobel, o americano Julius Axelrod, que, em 1960, descobriu as substâncias que permitem a transmissão dos impulsos nervosos (neurotransmissores). Graças a esta descoberta deu-se um passo em frente no conhecimento da noradrenalina e da serotonina e foram desenvolvidos outros fármacos (tricíclicos e inibidores das monoaminoxidases), até se chegar aos modernos SSRIs, inibidores selectivos da recaptação da serotonina, aos NSRIs, inibidores selectivos da recaptação da noradrenalina, etc.
Entre as causas da depressão podem incluir-se factores sociais como o empobrecimento ou a solidão, a diminuição do humor, frequentemente manifestada após o parto ou a perda de um ente querido. Mas, sobretudo nas pessoas já predispostas, estes acontecimentos da vida podem actuar como causa desencadeante da doença. Noutros casos, pelo contrário, os sintomas podem surgir espontaneamente, como um facto inesperado e súbito. A depressão também pode ter um componente hereditário. De facto, verificou-se que esta doença tende a apresentar-se mais frequentemente no seio dos elementos de uma mesma família. Esta teoria foi confirmada por vários estudos realizados em filhos de pais que sofriam de perturbações do humor, criados por pessoas não afectadas por estes problemas; verificou-se que estes indivíduos apresentavam perturbações do humor que nunca se tinham manifestado nos pais adoptivos.
Uma questão de transmissão
A depressão manifesta-se quando determinados sistemas de transmissão entre as células do cérebro, ou seja, os neurónios, se alteram. Com efeito, para que o sistema nervoso funcione bem, é necessário que a transmissão das mensagens eléctricas de um neurónio para outro ocorra através do ponto de contacto entre uma célula e outra, que se designa por sinapse. Quando uma mensagem eléctrica enviada por um neurónio chega à sinapse, provoca a libertação de determinadas substâncias químicas, os neurotransmissores, que funcionam como mensageiros, depois de passarem ao neurónio seguinte onde provocam a saída de um novo sinal eléctrico.
Consequentemente, quando a actividade de alguns neurotransmissores se altera, podem ocorrer "transmissões perturbadas". Especificamente no aparecimento da depressão, são dois os neurotransmissores principalmente implicados: a serotonina e a noradrenalina, que estão envolvidas em todas as funções que se apresentam alteradas durante a depressão e que provocam os sintomas característicos desta. Para além das causas ou, pelo menos, entre os factores da depressão, podemos citar:
Factores ocupacionais
Factores ligados a acontecimentos acidentais
Um diagnóstico de depressão major deve basear-se nos seguintes critérios:
- Pelo menos cinco dos seguintes sintomas - um dos quais deve ser humor deprimido ou diminuição do interesse ou do prazer - que se manifestem quase todos os dias, durante pelo menos duas semanas, e que representem uma mudança relativamente ao comportamento emotivo e funcional habitual do indivíduo:
- Humor deprimido (o indivíduo sente-se cansado ou vazio ou parece cansado e sempre a ponto de começar a chorar)
- Diminuição marcada do interesse e do prazer em todas, ou quase todas as actividades
- Aumento ou perda de peso significativos, sem qualquer dieta (por exemplo, mais de 5% do peso corporal num mês) ou aumento ou diminuição do apetite
- Aumento ou perda de sono, em relação ao habitual.
- A diminuição ou aumento da rapidez na execução de actividades observdas por terceiros
- Fadiga ou perda de energia
- Sentimentos de inutilidade ou de culpa, excessivos ou injustificados
- Dificuldade em pensar, concentrar-se ou tomar decisões
- Pensamentos recorrentes de morte (não apenas medo de morrer), pensamentos suicidas recorrentes, sem um plano concreto ou sem tentativa de suicídio, ou com um plano concreto para cometer suicídio.
- Profundo sofrimento ou comprometimento das actividades sociais ou profissionais ou de outras funções importantes.
- Os sintomas não são imputáveis aos efeitos directos de uma substância química (por exemplo, drogas ou fármacos) ou de uma doença (por exemplo, hipotiroidismo).
- Os sintomas persistem para além de dois meses após a perda de um ente querido.
Um diagnóstico de distimia, por sua vez, deve basear-se nos seguintes critérios:
- Humor deprimido, referido pelo próprio indivíduo ou observado por outros, quase todos os dias e durante grande parte do dia, ao longo de dois anos.
- Pelo menos dois dos seguintes sintomas durante os momentos de depressão:
- Falta ou excesso de apetite
- Mais ou menos sono em relação ao habitual
- Perda de energia ou fadiga
- Diminuição da auto-estima
- Dificuldade em concentrar-se ou tomar decisões
- Sensação de desespero
- Durante estes dois anos (um ano para as crianças e adolescentes), os períodos durante os quais não são observados sintomas não se prolongam por mais de dois meses.
- Durante os dois primeiros anos (um ano para as crianças e adolescentes) após o início da perturbação, não se manifestarem episódios de depressão major.
- Nenhum episódio maníaco ou hipomaníaco.
- Ausência de outras perturbações mentais (esquizofrenia, por exemplo)
- Os sintomas não são imputáveis ao uso de substâncias químicas (drogas ou fármacos) ou a doença (hipotiroidismo, por exemplo)
- Profundo sofrimento ou comprometimento das actividades quotidianas.
O auto-teste
Os indivíduos afectados por uma perturbação depressiva:
- Sentem-se cronicamente deprimidos, tristes, vazios, desencorajados e choram com frequência
- Não demonstram interesse nem prazer na prática de actividades que anteriormente consideravam agradáveis, comem mais ou menos do que habitual e ganham ou perdem peso
- Dormem mal ou muito mais do que o habitual
- Sentem-se mais lentos nos movimentos, ou inquietos
- Sentem-se cansados, apáticos e sem forças
- Sentem-se impotentes, desesperados e inúteis
- A concentração causa-lhes fadiga
- Estão menos eficientes ou produtivos do que anteriormente
- Têm dificuldade em pensar com lucidez ou em tomar decisões
- Têm problemas de memória
- Pensam constantemente em morte ou suicídio
- Têm uma má opinião de si próprios, sentem-se abatidos, inadaptados
- Pensam frequentemente no passado
- Não mostram interesse pelo sexo ou têm uma actividade sexual menos intensa do que o habitual, fechando-se em si próprios
- Desenvolvem sintomas físicos como cefaleia, problemas digestivos, dores difusas
Terapêutica
A depressão é uma doença a não subestimar, mas que se pode tratar com óptimos resultados recorrendo aos tratamentos mais seguros e eficazes. O diagnóstico de depressão é, de facto, um primeiro passo ao qual se deve seguir a identificação exacta do tipo de depressão e a reconstrução da história do doente, de forma a que o problema seja devidamente enquadrado. Só quando o médico está na posse destes dados pode prescrever o tratamento. Para estabelecer com a máxima precisão o tipo e grau de depressão, os especialistas dispõem de diversas escalas que, na prática, são questionários a que os doentes têm de responder. Com base na pontuação e na interpretação das respostas pelo médico será então possível obter indicações úteis sobre a gravidade da doença e seleccionar o tipo de terapêutica.
Actualmente, a solução ideal prevê a associação da psicoterapia aos psicofármacos. Em qualquer caso, é necessário iniciar o tratamento de imediato, ou seja aos primeiros sinais da doença, porque só desse modo este será mais eficaz. Além disso, há situações em que o uso dos fármacos é indispensável e outras em que esse uso é insuficiente ou inapropriado.
Os fármacos
Os fármacos antidepressivos actuam sobre os sistemas do cérebro que regulam a transmissão nervosa e, concretamente, sobre os neurotransmissores serotonina e noradrenalina, que estão directamente envolvidos na origem da depressão. O princípio que está na base do seu funcionamento é o de aumentarem o nível destes transmissores, potenciando os seus efeitos a nível cerebral e reequilibrando, no tempo, os mecanismos neuronais alterados pela doença.
Na prática, os fármacos impedem que a serotonina e/ou a noradrenalina sejam reclamadas pelos neurónios que as produzem, de modo a poderem chegar ao destino, designadamente aos neurónios que devem recebê-la. Isto faz com que os dois neurotransmissores consigam desempenhar correctamente a sua função, que consiste em transportarem mensagens electroquímicas entre os neurónios. Normalmente, os fármacos são eficazes em cerca de 80% dos casos de depressão, independentemente da causa que está na sua origem.
A acção dos fármacos começa a ter os seus primeiros resultados após um período que varia entre duas e três semanas de administração diária, podendo ser necessária uma administração mais prolongada para obter o máximo de eficácia. Além disso, embora todos os fármacos sejam potencialmente eficazes, nem todos os doentes respondem da mesma forma ao mesmo composto. Nos primeiros dias de tratamento, é aconselhável que o doente se mantenha em contacto constante com o médico, a fim de lhe comunicar eventuais efeitos secundários produzidos pelos fármacos.
Efeitos secundários dos antidepressivos
Para além da eficácia, variável de doente para doente, os antidepressivos diferenciam-se entre si pelos efeitos secundários que podem provocar.
Entre os efeitos indesejáveis mais comuns incluem-se:
- Perturbações gastrintestinais
- Secura da boca
- Perturbações da visão
- Obstipação
- Vertigens
- Sonolência durante o dia
- Aumento ou perda de peso
- Insónia
- Inquietação
- Cefaleias
- Perturbações urinárias
- Perturbações cardiovasculares
- Perturbações sexuais
Os que são considerados mais graves são:
Terapêutica de longo prazo
O tratamento antidepressivo deve ter uma duração mínima de três meses após o início dos sintomas; seguidamente, a necessidade de prosseguir a terapêutica deve ser considerada com base nas necessidades individuais e na avaliação da relação entre os efeitos secundários e os benefícios do tratamento.
Obtidos os primeiros efeitos terapêuticos, distingue-se um período de continuação e um período de manutenção da administração do fármaco. Este prolongamento da terapêutica é necessário para evitar eventuais recidivas de uma depressão não completamente curada.
A depressão tem uma duração prolongada. Ainda que, após um episódio, o regresso ao ritmo de vida normal seja completo, 8 doentes em cada 10 sofrem uma recidiva. Além disso, quanto mais episódios depressivos um doente sofrer, mais facilmente está sujeito a eles. E esta situação pode ter repercussões negativas na sua vida relacional.
Por este motivo, é necessário prescrever uma terapêutica de continuação, de forma a prevenir a recaída, enquanto a terapêutica de manutenção previne a recidiva da doença, ou seja, o aparecimento de um novo episódio após a remissão completa de uma crise de depressão anterior.
A psicoterapia
Acompanha geralmente o tratamento farmacológico e pode ser uma ajuda para o bom êxito da terapêutica.
Muito importante neste caso é o papel do psicoterapeuta, que deve procurar incutir no doente a constância necessária para prosseguir a terapêutica farmacológica. A psicoterapia compreende diversos tipos de tratamento psicológico individual, de grupo, ou familiar que, através de conversas e exercícios, geridos por um terapeuta qualificado, ajudam o doente a ultrapassar a crise, incutindo-lhe segurança e dando-lhe o apoio necessário.
São três os tipos de terapêutica utilizados com mais frequência:
- Terapêutica comportamental
- Terapia cognitiva
- Terapêutica interpessoal
Tem por objectivo colocar em evidência hábitos, comportamentos e pensamentos que possam favorecer o aparecimento de sintomas depressivos e procura convencer o deprimido a modificar o decurso dos acontecimentos, de forma a superar as suas próprias dificuldades.
Ajuda a examinar os pensamentos e a visão da realidade e tem por objectivo modificar os pensamentos pessimistas.
Enquadra a modalidade de relação com os outros. Assim, trata-se de uma terapia de grupo que ajuda os doentes a compreenderem que não estão sós e que se podem ajudar mutuamente, encorajando-se entre si e discutindo os seus próprios problemas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário